Hoje termina a décima edição do festival gay e lésbico de Lisboa. A última noite deste ano (com certeza para o ano haverá mais) vai passar-se num sitio emblemático da cidade de Lisboa: o São Jorge, localizado na Avenida da Liberdade.
Muitos, entre os quais estarão alguns ilustres e activistas membros da chamada comunidade glbt, perguntam-se do porquê e do para quê deste certame. O nome da Avenida, onde decorre esta noite, fornece a pista para as respostas.
Na madrugada de 26 de Abril de 1974 o país não amanheceu diferente para todos os cidadãos nacionais. Os homens e mulheres de Abril optaram por libertar o país dentro dos limites daquilo que as suas burguesas mentes permitiram. Os seus devaneios liberais não iam mais longe do que sonhar com "gloriosas" Albânias sobre o Atlântico e, nunca nem nos Verões mais quentes, algum, ou alguma ousou recordar o Povo e o País que havia um grupo especial de Portugueses que tinha sofrido às mãos da sociedade retrógrada e da sua polícia política e de costumes: os Homossexuais Portugueses (para quando alguns relatos na primeira pessoa de Cesariny por exemplo?).
Nem os quase dez anos passados desde uma suposta revolução sexual, que pelos EUA e Europa produzia as primeiras gerações que iriam adoptar comportamentos liberais em relação às comunidades glbt, chegaram para incluir em Abril a Homossexualidade.
Foi preciso passar muito tempo sobre a normalização democrática para que outra geração, que não a que tinha feito Abril, desse os primeiros passos, com o aparecimento da ILGA, do Pride e do Festival. Mas será que já se caminhou o suficiente? Creio que não.
E é por isso que este Festival é tão relevante. É talvez o único acontecimento específico da comunidade glbt em Portugal a rivalizar em qualidade com outros análogos não glbts. É, também, aquele que é mais aberto e "participável" por heterossxuais, afinal basta que apreciem bons filmes e que, em vez de um beijo entre Ingrid e Bogart, não se importem que o beijo seja dado entre duas Ingrids, ou dois Bogarts.
E este Festival é necessário porque, para além de ser o único veículo de divulgação de filmes, curtas, documentários desa temática em Portugal, há muitos, entre nós, que precisam dele. Os jovens da Casa de São José do Porto, muitos Viseenses e até, pasme-se, muitos alfacinhas, como os que fazem esperas à porta do Lux, ou que vão atacar pessoas, pelo seu aspecto, junto aos armazéns do Chiado.
Por isso mesmo, mesmo que não goste, ou compreenda todos os filmes, todos os anos, ao longo dos últimos dez anos emprestei o meu apoio ao Festival. Houve uns anos, os primeiros, em que esse apoio foi mais intenso e me deu amizades que perdurarão para o resto da vida. Depois, houve outros anos, em que assistimos à chegada de sangue novo, sempre um óptimo sinal, especialmente quando ganham pé tão depressa. Houve os anos de "oiro" de João Soares e os anos negros de Santana Lopes.
Haverá, estou confiante, muitos mais.
De Bag